miércoles, 31 de octubre de 2012

Entrevista | Mário Magalhães
“ALN estava infiltrada pela CIA”
Após nove anos de pesquisa, jornalista lança biografia definitiva de Carlos Marighella, revela nome de agente duplo, conta affair do comandante da ALN com militante e desnuda a “Rede Vinícius
Ex-repórter e ex-ombudsman da “Folha de S.Paulo”,
Mário Magalhães demorou nove anos para concluir
biografia definitiva do comandante da Ação Libertadora
Nacional (ALN)
Renato Dias
Especial para o Jornal Opção
Italiano radicado no Brasil, Alessandro Malavasi era o agente da CIA infiltrado na Ação Libertadora Nacional (ALN), organização de esquerda que adotou a estratégia da luta armada para tentar derrubar a ditadura civil-militar e implantar o socialismo no Brasil.

É o que revela, em entrevista exclusiva ao Jornal Opção, o jornalista Mário Magalhães, ex-“Folha de S. Paulo”. Ele lançou na quarta-feira, 24, o livro “Marighella — O Guerrilheiro que Incendiou o Mundo”, pela Editora Companhia das Letras.
A obra saiu do forno após nove anos de trabalho, dos quais cinco anos e nove meses em dedicação exclusiva; 256 entrevistas; pesquisas em arquivos da Rússia, República Tcheca, Estados Unidos, Paraguai e Brasil.

Mário Magalhães informa ao Jornal Opção ter consultado também mais de 600 títulos. O que serviu para a produção de 2.580 notas sobre fontes de uma história contada em 569 páginas, cerca de 170 de apêndices e 48 de imagens.

“Marighella rende filme e minissérie de tirar o fôlego. Com um protagonista com projeção mundial, e não apenas dentro das fronteiras do Brasil. Alguns amigos costumam discutir quem seria mais indicado ao papel: Denzel Washington ou Wesley Snipes”, afirma Mário Magalhães.

O autor diz que um agente da repressão é quem teria apontado as ligações dos dominicanos com a ALN, entre eles Frei Betto. “Em 1968, o Dops paulista já montava campana diante do convento da Ordem Dominicana, à espera de Mari­ghella”, frisa.


Frei Betto diz em “Batismo de Sangue” que havia uma infiltração na ALN e que a tigrada envolveu os dominicanos para incriminá-los [tese criticada duramente por Jacob Gorender, no livro “Combate nas Trevas”]. A informação procede?
Não havia uma infiltração inimiga na ALN, mas várias. Considerei no livro testemunhos pessoais, é claro. Mas as provas fundamentais nesse caso são documentos oficiais e secretos impressos, e não especulação. Enquanto Marighella viveu, duas infiltrações na ALN se destacaram: a de um agente que apontou a conexão dele e da organização com frades dominicanos, ainda em 1968. E a de um espião a serviço dos Estados Unidos, que viajou com Marighella até o Brasil Central, como motorista. Em 1968, o Dops paulista já montava campana diante do convento da Ordem Do­minicana, à espera de Mari­ghella. A pergunta mais apropriada talvez não seja como a polícia política chegou até Marighella, mas por que demorou tanto. Mas não foi por meio de nenhum desses dois espiões mencionados que os órgãos de segurança alcançaram Marighella, como explico em pormenores na biografia.  A síntese é: quem matou Carlos Marighella foi a ditadura militar. O governo da época tentou responsabilizar frades dominicanos por um crime — mais de 29 agentes mataram um homem desarmado — com a intenção de desmoralizar a Igreja de oposição em geral, e a associada à luta armada em particular. Os dominicanos não traíram ninguém, e sim lutaram contra um regime de terror. [Jacob Gorender diz que os militares chegaram a Marighella depois de prender e torturar frades dominicanos.]
Dom Tomás Balduíno chegou a circular com Carlos Marighella?
Ele me assegurou que não. E brincou dizendo que não teve a honra de conhecer Marighella pessoalmente. 
 
Houve contato de Dom Pedro Casaldáliga com o comandante da ALN?
Quem me contou ter recebido apoio logístico de Dom Pedro Casaldáliga foi o casal de militantes da ALN Janete (hoje deputada federal) e João Alberto Capiberibe (senador pelo Amapá). Quando Marighella foi morto, eles já estavam instalados às margens do Rio Tocantins, em uma das bases das futuras colunas móveis guerrilheiras da ALN, que acabaram por não se transformar em realidade.Alfredo Moles  tomando un mojito
 
O sr. relata no livro o sequestro de um avião da Varig, em 4 de novembro de 1969, no Aeroporto de Ezeiza, em Buenos Aires, arquitetado por Joaquim Câmara Ferreira?
Sim. A logística foi proporcionada pela “Rede Vinicius”, coordenada pelo médico argentino Alfredo Moles. Ele a montou em Buenos Aires, a pedido da espionagem cubana. Moles encontrou-se com Marighella no Brasil, mas seu contato mais amiúde era com Câmara Ferreira, como ele me confidenciou. O médico viria a batizar o esquema com o nome de Vinicius de Moraes por dois motivos: era fã do poeta brasileiro e como um protesto pela perseguição do Itamaraty contra Vinicius, diplomata de carreira. É importante distinguir o sequestro de 4 de novembro de 1969, primeira ação aérea da ALN, com o de outubro daquele ano, obra do MR-8. Um livro de dois ex-funcionários de segurança americanos confunde a ALN com o sequestro de outubro, com o qual a organização não teve nada a ver.
 
Como a repressão chegou até os dominicanos e depois a Marighella?
Os documentos mostram que um infiltrado na ALN, na cidade paulista de Marília, informou em 1968 que haveria uma reunião da organização no convento paulistano dos dominicanos. Mais grave, que Marighella estaria presente. O Dops montou uma tocaia para pegá-lo na rua Caiubi, o local do convento, mas a reunião não se realizou. Essa foi a primeira pista, ainda em 1968. O nome do infiltrado, com quem conversei, consta do livro. Em 1969, a pista inicial foi o telefone do convento dos dominicanos anotado em um talão de cheques apreendido com um militante da ALN. A partir daí, por meio de tortura, o Dops paulista alcançou Marighella. A responsabilidade por informação obtida mediante tortura é do Estado, por meio do seu agente, o torturador. E não de quem é torturado. O livro tem a narrativa de romance, com drama, aventura, ação, humor, amores, ideias, mistérios e espionagem, só que tudo é escrupulosamente real. No pormenorizado relato da morte de Marighella, faço uma inflexão analítica: quem matou Marighella foi a ditadura. Marighella não foi traído por nenhum companheiro seu. Os dias e horas finais de Marighella são reconstituídos na biografia com riqueza de detalhes inéditos. Ele foi morto de modo mais covarde e cruel do que se sabia até agora: estava desarmado. Mesmo assim o fuzilaram. Até o legista Harry Shibata me deu entrevista  relevante.
 
José Dirceu chegou a integrar a ALN ou apenas à Dissidência e o Molipo?
Em entrevista a mim, José Dirceu afirmou que integrou duas organizações à esquerda do PCB: a dissidência estudantil do PCB/SP e o Molipo (Movimento de Libertação Popular). Para discussões políticas, ele esteve duas vezes com Marighella e em muito mais oportunidades com Joaquim Câmara Ferreira.
 
Como foi a participação de Marighella na OLAS?
Muito intensa, como conto no capítulo intitulado “Conexão Havana: um filho de Oxóssi na terra da santeria”. O filho de Oxóssi é Marighella, como revelo no livro. Entrevistei muitas pessoas que estiveram com Marighella em Cuba: a mulher que o acompanhou na viagem, dois filhos de Francisco Julião, a ex-mulher de Julião, dois companheiros que lá estavam treinando guerrilha, uma tradutora-intérprete da conferência e mais gente. Além de ler relatos de outras pessoas. Bem como uma carta original de Julião, que estava no México, para Marighella, em Havana. Ganhei a correspondência de presente.
 
Quando Che Guevara circulou pelo Brasil, em direção à Bolívia, no ano de 1966, ele encontrou-se com membros do PCB militarista, como Marighella?
Com Marighella e Joaquim Câmara Ferreira, não. O vínculo do governo cubano era, então, com o grupo de Leonel Brizola.
 
Em “A Revolução Impossível”, Luís Mir (seguido de Jacob Gorender) diz que Marighella teria negociado com o general do Exército Albuquerque Lima. A informação é verídica?
Marighella tentou levar para a guerrilha dois tenentes-coronéis afastados da ativa do Exército em 1964. Eram membros do PCB. Um deles me descreveu a conversa, muito tensa — eles se recusaram. O comandante militar da ALN no Rio acompanhou Marighella em uma reunião com cinco oficiais militares. Um coronel da ativa do Exército se encontrou com o armeiro da organização guerrilheira. E Marighella teria negociado com um general-de-divisão, três estrelas, hipótese que se fortalece com novas descobertas documentais.
 
Quem era o agente da CIA que circulou com Marighella?
O informante a serviço da espionagem dos Estados Unidos, presumivelmente da CIA, chamava-se Alessandro Malavasi. Italiano de nascimento, passara a maior parte da década de 1950 preso, por ter sido um dos sequestradores de um jovem da família Matarazzo, crime comum. O livro descreve em detalhes como Malavasi se misturou e conviveu com a cúpula da ALN. Ironia: o Fusca no qual Marighella foi levado a um futuro local de passagem da guerrilha rural tinha as prestações pagas pelo aparato de espionagem norte-americano. No dia 7 de maio de 1969, foi montada pelo Dops em São Paulo uma tocaia para pegar Marighella, depois de os americanos terem obtido todas as informações que desejavam com a infiltração. Porém Marighella não apareceu, e outros militantes foram presos. Inclusive Rolando Frati, que só seria solto em setembro daquele ano, no sequestro do embaixador americano.
 
Marighella teve um affair com Zilda Xavier?
Não foi um affair, mas uma relação afetiva tão intensa quanto longeva — iniciou antes do golpe de Estado de 1964 e se prolongou até semanas antes da morte de Marighella, quando ele a enviou para Havana com a missão de barrar as interferências de funcionários cubanos nos negócios internos da ALN. Se informação sobre as coisas da ALN era poder, os três militantes mais poderosos da organização foram Carlos Marighella, Joaquim Câmara Ferreira e Zilda Paula Xavier Pereira. Zilda concedeu-me dezenas de horas de entrevistas.
 
Como era a personalidade do dirigente da ALN?
Marighella era um homem de ação e muito bem humorado. Tanto que os momentos em que ele se desespera são mais dramáticos ainda. Como em 1957, quando descobre que, em vez de messias, Stálin fora um impostor — Marighella foi parar em um psiquiatra, como descobri. Ou quando ele parece que se afogará nas próprias lágrimas de tanto chorar, em 1969, ao saber que o guerrilheiro Virgílio Gomes da Silva fora assassinado na tortura.
 
Qual a relação de Marighella com Joaquim Câmara Ferreira e Carlos Eugênio Sarmento Coelho da Paz?
Marighella e Joaquim Câmara Ferreira foram camaradas e amigos de 1937 a 1969. Gostavam-se muito, respeitavam-se e se completavam. O que não quer dizer que não tenha havido choques entre os dois, como narro no livro. Carlos Eugênio da Paz [o Clemente da ALN] era um adolescente em 1969. Devido à sua amizade com os filhos de Zilda Xavier Pereira, conheceu Marighella, de quem se tornou próximo. Ao ser morto, Marighella carregava anotações com a inscrição “Quelé”. Os analistas dos órgãos de segurança jamais decifraram quem era. Tratava-se de corruptela de “Clemente”, o nome de guerra de Carlos Eugênio, referência ao jogador de futebol Ari Clemente.
 
Qual a sua análise sobre os filmes de Silvio Tendler e de Isa Grinspun?
Ótimos filmes, cada um ao seu modo. Gosto muito dos dois. Tenho afeto especial pelo filme de Isa, porque o acompanhei desde o começo. Tanto Silvio quanto Isa foram generosos comigo, fato que fiz questão de reconhecer nos agradecimentos do livro.
 
Procede a informação de que a ALN existiu pós-PT até 1984, quando se dissolveu no partido?
Há pessoas que se dizem militantes da ALN até hoje... Mili­tarmente, a organização teve em 1974 seus derradeiros suspiros  — e baixas, com os últimos desaparecidos.
 
Quanto tempo de pesquisa para a produção do livro? Quantos entrevistados? Ele pode virar filme?
Nove anos de trabalho, dos quais cinco anos e nove meses em dedicação exclusiva; 256 entrevistados e consultados (todas as entrevistas feitas por mim, sem “terceirizar” nenhuma); documentos secretos oriundos de arquivos públicos e privados de Rússia, Re­pública Tcheca, Estados U­nidos, Paraguai e Brasil; bibliografia de 600 títulos; 2.580 notas sobre fontes, ao final do livro (é direito do leitor conhecer a origem das informações), mas sem números de referência nas páginas, o que atrapalha a fluência da leitura; história contada em 569 páginas, mais cerca de 170 de apêndices, mais 48 de imagens. Marighella rende filme e minissérie de tirar o fôlego. Com um protagonista com projeção mundial, e não apenas dentro das fronteiras do Brasil. Alguns amigos costumam discutir quem seria mais indicado ao papel: Denzel Washington ou Wesley Snipes. Não tenho opinião formada.  


Perfil
Nome completo:  Mário Magalhães
Idade: 48
Formação: Formado em jornalismo na Escola de Comunicação da UFRJ
Veículo em que trabalhou: “Tribuna da Imprensa”, “O Globo”, “O Estado de S. Paulo” e “Folha de S. Paulo”, jornal em que foi repórter especial, colunista e ombudsman.
Minibiografia:  Mário Magalhães nasceu no Rio de Janeiro na primeira semana de abril de 1964. Formou-se em Jornalismo na Escola de Comunicação da UFRJ. Recebeu mais de 20 prêmios e menções honrosas no Brasil e no exterior, entre eles: Every Human Has Rights Media Awards, Lorenzo Natali Prize, Prêmio Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Medalha Chico Mendes de Direitos Humanos, Prêmio Vladimir Herzog de Direitos Humanos e Anistia, Prêmio AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), Grande Prêmio Esso de Jornalismo, Prêmio Folha de Reportagem, Prêmio Direitos Humanos-RS e Prêmio Dom Hélder Câmara de Imprensa (da CNBB, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil). Lançou em 2012 a biografia "Marighella — O Guerrilheiro Que Incendiou o Mundo", pela  Editora Companhia das Letras. Trata-se da obra mais completa sobre o líder guerrilheiro brasileiro e, claro, candidato natural a best seller.


“Um comunista na Comissão de Polícia”
Trecho do capítulo 12
 
Fim de 1946. Na Constituinte daquele ano (fevereiro-setembro), Marighella integrou a mesa diretora, conhecida como Comissão de Polícia. Com o fim da assembleia e a instalação da Câmara, ele deixou a mesa, dando lugar ao camarada Milton Caires de Brito, como narrado a seguir.
 
* * *
 
Ele cedeu a vaga comunista na mesa diretiva para o médico baiano Milton Caires de Brito, eleito por São Paulo. Continuou a coordenar a bancada e se viu mergulhado em mais uma campanha: em janeiro de 1947, os Estados escolheriam governadores e deputados. Apreensivo com ações judiciais e parlamentares pelo banimento do PCB, o partido patrocinou postulantes aos governos que se manifestaram pró-legalidade. Essa política resultou em apoios insólitos: da UDN, Otávio Mangabeira, na Bahia; do PSD, Walter Jobim, no Rio Grande do Sul; do Partido Social Progressista (PSP), Adhemar de Barros, em São Paulo. Todos se elegeram.

Marighella aproveitou as viagens à Bahia e pediu transferência de matrícula para a Faculdade Nacional de Engenharia, no Rio de Janeiro — não desistira de se formar. Fez comícios nas feiras livres de Santo Amaro e vendeu o jornal O Momento na rua Chile. O partido mobilizava novas multidões. Na capital, o compositor Mário Lago adaptou a letra de “Ai, que saudades da Amélia”, para pedir votos — encerrava com “o voto do povo é dos comunistas”. O violonista José Calazans, o Jararaca da dupla com Ratinho, fez a mesma coisa com “Mamãe eu quero” — “Olhe bem a lista, escolha os candidatos do Partido Comunista”.

O jogador Heleno de Freitas, craque e galã do futebol, ia aos comícios cariocas, mesmo sem ser filiado ao partido — acompanhava João Saldanha, o militante amigo seu e de Marighella que um dia comandaria a Seleção Brasileira. No Distrito Federal, o PCB fez a maior bancada na Câmara de Vereadores, dezoito em cinquenta. Na Bahia, dois deputados. No ato final da campanha, Marighella arrancou gargalhadas e aplausos ao zombar dos concorrentes:
 
“O que eles querem é rosetar!” 
Era uma brincadeira com o recente sucesso “Eu quero é rosetar!”. Jorge Veiga interpretava a marcha de Haroldo Lobo e Milton de Oliveira:
Por um carinho seu, minha cabrocha
Eu vou a pé ao Irajá
Que me importa que a mula manque
Eu quero é rosetar! [...].
 
O verbo “rosetar” podia significar esporear — um animal — ou fornicar. A malícia da letra levou a polícia a proibir sua execução no rádio e a apreender os discos. Foi mais um motivo para Marighella, determinado a organizar um bloco carnavalesco dos comunistas no Rio, denominá-lo Mula Manca — o nome pegaria em todo o país. Chegou aos seus ouvidos que a ideia contrariara Prestes, mas ele a manteve, e a mula estilizada saiu à frente dos foliões. Em raro tirocínio editorial, a Tribuna Popular obteve licença da prefeitura para promover o Carnaval de 1947. Batizou-o Carnaval da Paz e organizou concursos como o de Cidadão e Embaixatriz do Samba — ganharam os candidatos da escola Paraíso das Morenas, do morro de São Carlos. Na posse dos vencedores, alardeadas 200 mil pessoas encheram o Campo de São Cristóvão. Sem gravata, mas de paletó, Marighella talvez tenha se lembrado do tempo em que se fantasiava de cigana e fingia ler as mãos das moças no reinado de momo em Salvador.
 
Os cantores Ataulfo Alves e Ciro Monteiro e os compositores Pixinguinha e Heitor dos Prazeres divulgaram o apoio ao Carnaval da Paz. Em um ensaio da Mangueira, Cartola associou-se a dois brindes: à Tribuna Popular e à Estação Primeira — daria Portela. A empolgação era tamanha que o governo articulou uma entidade pirata para sabotar a União Geral das Escolas de Samba, controlada pelo PCB. Com o intuito — malsucedido — de esvaziar os festejos, a polícia proibiu as batalhas de confetes, em nome da manutenção da ordem. Choveu do sábado à segunda-feira, mas centenas de blocos não deixaram de brincar. Muitos cantaram uma versão para o samba “O pagamento ainda não saiu”, de Geraldo Pereira e Haroldo Lobo. Virou “O abono não saiu”, referência à reivindicação pelo abono de Natal, que só vigoraria em 1962, identificado como 13º salário. Fascinado pelo Carnaval desde menino, Marighella virava personagem de música — ao lado de Prestes, o “Senador do Povo”. Não foram poucos os foliões que, debaixo d’água, cantaram assim:
 
Ainda não fiz as compras
Que você me pediu
Porque o nosso abono ainda não saiu
 
Mas tenha calma, meu bem
O nosso abono sai para o mês que vem
 
Por isso lá na Câmara
Carlos Marighella fala
E o Senador do Povo
Fica na pista
Mas se o abono não sair
Cada vez mais é reforçado
O Partido Comunista.

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